Por José Pio Martin
Na manhã do dia 3 de agosto, ouvi a entrevista de um sobrevivente de um campo de concentração nazista, na rádio FM 95,1. Para grande parte da população, a Segunda Guerra Mundial e o extermínio de vidas humanas sob o comando de Hitler parecem assuntos distantes, temas de filmes e livros de história. Porém, quando um sobrevivente do horror nazista relata, em detalhes, o que foi aquele espetáculo de tortura e pavor, a tragédia toma forma e parece mais próxima de nós.
Num português arrastado e cheio de sotaque, aquele senhor fez uma apologia emocionada de amor ao Brasil e seu povo e disse que, apesar dos corruptos e da crise moral, nosso país vai progredir e atingir o desenvolvimento. Na sequência, ao comentar a entrevista com amigos, perguntaram-me por quais razões o Brasil é atrasado. Não há uma resposta única. Mas, comecei abordando o tema da baixa produtividade.
Se tomarmos a produção anual dos Estados Unidos e dividirmos pelo total de horas de trabalho da população, chegaremos a um valor em torno de 50 dólares. Fazendo a mesma conta para o Brasil, encontraremos um valor perto dos 10 dólares. Conhecido pelos economistas como “produtividade-hora/ano do trabalho”, esse indicador mostra que a produção de uma hora de trabalho nos Estados Unidos equivale a cinco vezes a produção de uma hora de trabalho no Brasil.
Por que essa diferença? Simplificadamente, podemos dizer que há seis causas: 1) o estoque de capital por trabalhador (infraestrutura, máquinas, equipamentos etc.) é muito maior lá do que cá; 2) o capital nos EUA é de melhor qualidade física e tecnologicamente mais avançado; 3) a qualificação média do trabalhador brasileiro é inferior; 4) os processos produtivos norte-americanos são mais organizados, mais disciplinados e mais eficientes; 5) o setor público brasileiro é menos eficiente; 6) a corrupção no Brasil é maior do que nos EUA.
Se quisermos imaginar um plano estratégio de longo prazo para o Brasil, podemos começar por dois grandes eixos: a eficiência e a moral. No eixo “eficiência” está o que é preciso fazer para melhorar a produção e a produtividade e para promover o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) a taxas anuais superiores às taxas de crescimento da população. No eixo “moral” estão as condutas adequadas para que os recursos sejam gastos com maior eficiência econômica, com mais equidade social e com menos corrupção.
Adam Smith dizia que há três virtudes fundamentais: a “prudência”, pela qual somos levados a prover o sustento nosso e de nossa família; a “justiça”, pela qual somos proibidos de prejudicar os outros; e a “bondade”, derivada do amor ao próximo e o desejo de ajudá-lo e favorecê-lo. Dessas virtudes, a única que o Estado pode me obrigar é a “justiça”. O Estado não pode me obrigar a ser prudente nem bondoso. No caso da bondade, não podendo contar com ela para promover o bem-estar dos indivíduos, a humanidade inventou um meio de fazê-lo: a tributação.
Pelo tributo, o governo leva todos, bons e maus, a fazerem o bem e a contribuírem para as políticas públicas de distribuição de renda e combate à pobreza. A bondade individual é substituída pela solidariedade social. Quando, porém, o governo é ineficiente na gestão dos recursos e, pelos desvios, torna-se imoral, não se tem nem a bondade pessoal nem a solidariedade social. É o pior dos mundos. E que tem isso a ver com a história nossa aqui? É que, enquanto a nação não progride a ponto de erradicar a pobreza pelo mercado, porque lhe falta eficiência econômica, cabe ao Estado, pelo tributo, mitigar as mazelas sociais.
A ineficiência (que desperdiça) e imoralidade (que desvia) destroem a capacidade de o governo fazer o bem e combater o sofrimento dos desvalidos e excluídos. Por isso, se há duas causas pelas quais vale a pena lutar, são a “eficiência” e a “moral”. É triste ver que, para defender um time de futebol, duas torcidas levam milhares de pessoas às ruas, enquanto para protestar contra a corrupção e o lamaçal de alguns homens públicos e privados não se consegue uma simples passeata.
Aquele senhor sobrevivente de um campo nazista, um imigrante que virou brasileiro e aqui constituiu família, tem razão ao enaltecer as riquezas naturais do Brasil e a índole pacífica de seu povo e, por isso, vê o futuro do país com otimismo. Mas, a marcha rumo ao progresso torna-se lenta e sofrida à medida que a ineficiência e imoralidade imperam no setor público e no setor privado.
José Pio Martins, economista, é Reitor da Universidade Positivo.
Sandro Soares
segunda-feira, 15 de agosto de 2011
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